Por Edkallen Lima
Em um mundo cada vez mais polarizado, a ascensão de líderes populistas e autoritários representa um desafio significativo para as democracias. O caminho que o Brasil está trilhando é motivo de grande preocupação. A influência da plutocracia financeira, aliada à manipulação política e ao desprezo pelo diálogo, agravada por uma crise institucional patrocinada por líderes extremistas, ameaça tornar o país ingovernável. É fundamental analisarmos esse cenário e buscarmos estratégias eficazes para enfrentá-lo.
Para compreender melhor essa situação, é pertinente analisar a origem e o uso do termo “politicamente correto”. Embora muitos o combatam com veemência e o utilizem como um espantalho em debates culturais, sua origem está ligada a debates identitários nos Estados Unidos, com complexidades sociais inerentes àquele país. No Brasil, esse conceito tem sido distorcido para justificar ataques a minorias e deslegitimar pautas progressistas. Líderes políticos como Donald Trump, Matteo Salvini, Jair Bolsonaro, Marine Le Pen, Giorgia Meloni e Javier Milei exemplificam como alguns políticos não hesitam em disseminar informações falsas em rede nacional para criar factóides, narrativas enganosas e conteúdos virais nas redes sociais, visando mobilizar suas bases de apoio.
Nesse contexto, o debate em que Kamala Harris confrontou Donald Trump é relevante para as forças democráticas mundiais. Não necessariamente por ela ou por suas crenças — sabemos que, nos Estados Unidos, o progressismo identificado com a esquerda não é predominante — mas por nos oferecer um modelo de como enfrentar figuras semelhantes a Trump e outros populistas emergentes. Harris demonstrou que é possível desmascarar inverdades e expor contradições sem cair em provocações ou perder a compostura. Sua postura firme e segura desconcertou o adversário, mostrando a eficácia de uma abordagem assertiva e baseada em fatos. Embora as complexidades eleitorais norte-americanas tornem difícil prever resultados e cravar quem vai vencer as eleições, o que ela nos ensinou naquele debate é inestimável.
A abordagem de Harris difere significativamente da que Tábata Amaral tem adotado em sua atuação política na campanha paulistana, embora suas iniciativas sejam apreciadas. Enquanto Tábata busca um diálogo mais confrontativo, apelando para a verdade e por vezes entrando em provocações de adversários como Marçal, talvez seja necessário ser mais estratégico ao enfrentar líderes populistas que distorcem fatos e exploram emoções para manipular a opinião pública. É fundamental comunicar-se de forma clara e empática, falando a linguagem do povo, para o povo e pelo povo. Não é uma tarefa fácil, sabemos. No entanto, é urgente que tentemos, sob pena de aprofundarmos divisões sociais e políticas com consequências negativas para o país e para o mundo.
Enfrentar líderes populistas de inclinação fascista por meio do diálogo é um desafio complexo que exige estratégias cuidadosas e um compromisso genuíno com a democracia. É fundamental promover um diálogo baseado em fatos, utilizando dados e evidências verificáveis para contestar desinformações sem alienar o público, como os moderadores dos debates norte-americanos fizeram ao vivo, desmascarando as múltiplas inverdades apresentadas por Trump, por exemplo. Líderes populistas frequentemente exploram narrativas falsas ou distorcidas e contrapor essas narrativas com informações claras e acessíveis pode minar sua credibilidade.
Abordar as preocupações subjacentes que levam as pessoas a apoiar esses líderes é igualmente crucial. Reconhecer e validar inseguranças econômicas, desigualdades sociais e medos em relação às mudanças permite oferecer soluções concretas e alternativas viáveis, demonstrando empatia e compreensão. Fomentar conversações inclusivas cria espaços onde diferentes vozes podem ser ouvidas, especialmente as de grupos marginalizados. Isso ajuda a desmontar a narrativa de “nós contra eles” utilizada pelos populistas, promovendo a construção de pontes e a redução de tensões sociais.
A empatia e o respeito devem guiar todas as interações. Abordar discussões com consideração, mesmo diante de opiniões divergentes, evita reforçar divisões. Reforçar os valores democráticos é indispensável. Destacar a importância das instituições democráticas, do Estado de Direito e dos direitos humanos demonstra como a proteção dessas estruturas beneficia toda a sociedade e alerta sobre os riscos de sua erosão. Exemplo disso foi a formação de uma frente ampla que contribuiu para a vitória nas últimas eleições brasileiras.
Narrativas positivas precisam ser ampliadas, pois o caos alimenta o extremismo. Nesse sentido, é importante compartilhar histórias de sucesso e exemplos de políticas inclusivas que impactaram positivamente a vida das pessoas, oferecendo esperança e alternativas ao discurso pessimista e caótico dos populistas. As ações de base fortalecem os laços sociais e constroem relacionamentos de confiança com comunidades locais. Projetos comunitários e programas de voluntariado podem oferecer suporte onde o Estado ou outras instituições falham em atender, preenchendo lacunas que poderiam ser exploradas por líderes autoritários e populistas.
Promover a alfabetização midiática, capacitando os indivíduos a se tornarem consumidores críticos de notícias, pode reduzir o impacto das fake news. Ao entender como a informação é produzida e disseminada, a população fica menos suscetível a manipulações e narrativas enganosas.
Por fim, exercer liderança com integridade é fundamental. Líderes políticos e sociais devem exemplificar transparência, responsabilidade e ética. Ao demonstrar esses valores na prática, é possível reconstruir a confiança nas instituições e na classe política, que são essenciais para a democracia.
O desafio atual é gigantesco, pois a influência desproporcional de elites econômicas e financeiras pode afetar a governabilidade e a tomada de decisões políticas. Essas forças, ao patrocinarem meios de comunicação que repetem e reforçam determinadas ideologias, dificultam a construção de um diálogo plural e democrático. É difícil enfrentar esse cenário sem correr o risco de ser sabotado ou incompreendido, até mesmo por amigos e familiares. É como tentar construir uma casa enquanto alguém remove os alicerces.
Sem diálogos institucionais claros e distantes de práticas políticas pouco produtivas, o Brasil corre o risco de se tornar um país ingovernável como a Itália, que enfrenta crises políticas constantes devido a coalizões instáveis e interesses conflitantes. Nossa situação é agravada pela desigualdade extrema e pela influência desproporcional de elites econômicas que muitas vezes não têm interesse no bem-estar coletivo.
Para evitar que o país se torne ingovernável, é essencial que as forças democráticas aprendam a enfrentar líderes populistas de maneira eficaz, inspirando-se em exemplos como o de Kamala Harris no primeiro debate presidencial norte-americano. Além disso, é necessário enfrentar a influência excessiva das elites financeiras, promovendo reformas que fortaleçam as instituições democráticas desde a base da pirâmide social. Por meio de ações coordenadas e estratégias inteligentes, poderemos superar os desafios atuais e construir um país mais justo e governável. Somente por meio da colaboração e do respeito mútuo poderemos preservar a democracia e construir um futuro mais inclusivo.
O Brasil está em um ponto crítico de sua história, e as decisões que tomarmos hoje terão impactos profundos nas futuras gerações. Enfrentar o populismo autoritário requer coragem, estratégia e um compromisso inabalável com os valores democráticos. Ao promover o diálogo, a inclusão e a educação, e ao exigir integridade de nossos líderes, podemos reverter o curso atual e trabalhar em direção a um país mais justo, democrático e unido. A responsabilidade é de todos nós, e o momento de agir é agora.
Edkallen Lima é acreano, Policial Federal, mestre em Ciência da Computação e professor.